Quando decidimos fazer o intercâmbio de seis meses com possibilidade de ficar um ano, começamos a pensar no que agregaríamos para não pensarmos no que "perderíamos" no Brasil ao ficar um tempo considerável fora.
Como eu e Matheus estávamos começando a ver dinheiro, mas não estávamos sabendo nos organizar tão bem, nos prometemos que ao chegarmos aqui seríamos mais responsáveis, uma vez que aqui nada é parcelado: ou você tem dinheiro para comprar algo ou você não tem. E você sempre tem! Basta se organizar.
O fato é que chegamos aqui com essa ideia na cabeça, mas faltou determinação para sentarmos toda noite e anotarmos os gastos diários. Faltou determinação para sabermos exatamente quanto estávamos gastando com necessidade (aluguel, luz, alimentação e ônibus) e quanto estávamos gastando com lazer.
Conclusão: o dinheiro acabou um pouco antes do que esperávamos.
Moral da história: ontem, navegando pelo Facebook, uma menina que também está em Dublin e me adicionou para pedir ajuda, pois está procurando emprego desde que chegou, mas até agora não conseguiu nada, publicou um texto sobre finanças. Eu, sempre muito curiosa, fui ler.
Bingo! É isso. Organização e determinação.
Graças a Deus, eu e Matheus estamos ainda no início e não tivemos chances para nos enrolar financeiramente de forma muito ruim, mas o fato é que se não pararmos e mudarmos de postura agora, isso, infelizmente, poderá acontecer conosco!
Portanto, esse post sela agora o nosso compromisso diário com a nossa vida financeira.
O outro assunto é algo que ficou pendente; é a minha primeira experiência de emprego aqui em Dublin.
Poderíamos considerá-la como parte da série "Despindo-me dos preconceitos", pois meu primeiro emprego aqui em Dublin foi como Au Pair.
Consegui a vaga através de uma brasileira que publicou no Classificados - Dublin que estava saindo da casa e que por isso a vaga estaria disponível. Mesmo sabendo que era live in, enviei o meu CV para ela, uma vez que era uma criança só - o que é incomum aqui na Irlanda - e que eu já estava procurando emprego há muito tempo.
A brasileira disse que mostrou meu currículo e meu perfil do Facebook para a mãe e que a mãe havia aprovado.
No dia seguinte fui para a entrevista.
A mãe pareceu super legal. Perguntou sobre a minha vida no Brasil, sobre a minha alimentação, disse que eu teria que levar a menina para escola, buscá-la, preparar o lanche e o jantar dela, dar banho uma vez por semana e disse que me pagaria 100 euros por semana mais o cartão do ônibus porque entendia que eu continuaria pagando aluguel na minha casa.
Era pouco, mas era algo. Então, aceitei.
Nos primeiros dias da primeira semana tudo foi muito bem. Até que numa manhã ela gritou comigo dizendo que a casa estava uma verdadeira bagunça e que ela não conseguia encontrar nenhuma roupa da menina.
É claro que me deu vontade de dizer: Oi? Nunca te faltei com respeito e você me contratou como babá. Não faz parte das minhas obrigações organizar a sua casa. Você sequer tocou nesse assunto quando conversamos.
Mas calei-me e durante aquela tarde organizei TODO o gaveteiro da menina, colocando, inclusive, etiquetas do lado de fora para que elas se localizassem nas gavetas.
Não ouvi nem um "obrigada".
Lembro-me bem de que no dia que recebi as instruções da menina que trabalhava lá antes de mim perguntei se eu teria que tirar lixo, arrumar a casa, etc. Ao que ela respondeu que não, que a única coisa que eu tinha que fazer era tomar conta da pequena. Ela disse ainda que NUNCA tirava o lixo e que só limpava a casa, que não organizava porque, segundo ela, eu perceberia em breve que elas não eram nem um pouco organizadas e que não faria a menor diferença eu organizar as coisas. Seria mera perda de tempo.
Ela não mentiu. A casa era completamente desorganizada! Coisas de banheiro na sala, comidas na geladeira vencidas há mais de um ano, e por aí vai... dá para imaginar, não é?
No dia seguinte, por conta própria, resolvi passar o aspirador na casa, porque eu estava incomodada. E nesse mesmo dia, à noite, ela chegou e disse que eu deveria limpar a casa porque estava um nojo, sem sequer ter olhado para o chão que não só havia sido aspirado, como havia sido limpo com um pano úmido e um dos produtos de limpeza que eu encontrei lá.
Ah! é até importante dizer para quem está vindo que os irlandeses não ligam muito para higiene nem para organização.
Eles tomam poucos banhos, quase não cuidam dos cabelos, não escovam os dentes com a mesma frequência do que nós, não limpam a casa como nós, não lavam a louça como nós...
Dessa vez eu falei: Olhe pro chão. Eu fiz isso hoje.
E ela ficou sem graça.
A semana acabou e ela não me pagou, conforme havia prometido. Foi me pagar só no meio da semana seguinte e mesmo assim, quis pagar só 80 euros, nada além. Ela nem me entregou em mãos. Deixou o dinheiro embaixo do calendário na cozinha. Claro que eu não peguei! Esperei ela dizer que aquele dinheiro era meu.
Fiquei o dia inteiro tentando acreditar que aquele não era o meu dinheiro e pensando no que falar quando ela viesse me entregar.
Quando ela me entregou, à noite, eu criei coragem e disse: Eu pensei que tivéssemos combinado 100 euros por semana mais o cartão de 5 dias.
E ela respondeu que não me daria o cartão porque eu tinha usado o meu, então não tinha necessidade de ela me dar um, mas que me daria na próxima semana e completou dizendo que se eu não estivesse satisfeita que eu poderia pegar as minhas coisas e ir embora.
Só que eu tinha usado o meu para buscar a filha dela na escola e não tinha cartão para o final de semana para ir para a minha casa. Como é que ela não tinha que me dar um cartão para cobrir o que tirei do meu bolso?
Argumentei novamente, de forma educada, dizendo que o meu cartão estava contado para as minhas necessidades e que eu precisava de um para voltar para a minha casa no final de semana.
Aí ela "resolveu" me pagar 20 euros a mais, que seriam pelo cartão que eu havia usado, mas disse que esse novo cartão que eu comprasse deveria servir para a próxima semana também. Disse que estava me dando o dinheiro do cartão antecipadamente.
Oi? Antecipadamente? Como assim? Eu usei o meu cartão com a sua filha! Você está me pagando pelo serviço que eu prestei. Isso não é nenhum favor. Era só isso que eu pensava...
Mas ok, engoli e passei por cima disso. Mas me prometi que jamais seria tola novamente de dizer a ela que tinha do meu dinheiro ou do meu cartão e que ela poderia me pagar depois.
Na semana seguinte decidi conversar com ela sobre o pagamento mais uma vez, pois eu havia chegado à conclusão de que era injusto o que ela estava fazendo comigo, especialmente porque nessa segunda semana ela havia começado a exigir, grosseiramente, que eu lavasse as roupas, colocasse-as para secar, guardasse-as quando estivessem secas, retirasse os lixos, lavasse todas as louças, limpasse e organizasse a casa, cozinhasse e cuidasse da menina. Ou seja: ela queria uma doméstica, não uma babá! E pagando apenas 80 euros por semana!
Aqui na Irlanda, se você trabalha quatro ou mais horas já tem respaldo das leis trabalhistas, mas precisa de um contrato que prove isso, naturalmente.
Eu acordava às 6:00 e ia dormir às 22:00. O único horário que eu tinha para mim era de 9:45 às 13:00, que era quando eu estava no curso, estudando. Fora isso, tudo em função dela. E ela queria me pagar 80 euros por semana?! Quando o mínimo aqui é 8,65 por hora. Façam as contas e vejam quanto a menos eu estava ganhando por tudo que ela queria que eu fizesse!
Quando sentei e fui conversar com ela, ela teve a cara de pau de dizer que NUNCA tinha dito que me pagaria 100 euros por semana porque ela já tinha gastos demais comigo dentro de casa, como luz e comida. Sendo que eu nem ficava na casa dela em minhas folgas, como a menina que trabalhava lá antes fazia.
Levando a menina para a escola cheguei a perguntar como quem não quer nada se ela se lembrava de quanto a mãe dela tinha dito que me pagaria alegando que eu havia esquecido. Ela, sem titubear, logo soltou: 100 euros por semana. Portanto, eu não tinha entendido errado nem estava ficando maluca. A mãe era mesmo mau caráter.
Engoli mais uma vez, mas decidi que iria procurar outro emprego, pois aquela situação estava me desagradando mais a cada dia.
Numa sexta-feira à noite ela resolveu me dar folga, do nada! Disse que mandaria a menina para Galway, que é uma cidadezinha aqui na Irlanda, e que depois elas viajariam para a Escócia.
Como eu já estava de saco cheio, perguntei uma vez só se ela realmente não precisaria de mim. Ela disse que não, então, eu piquei a mula no dia seguinte de manhã!
Cheguei a voltar na casa uma vez para pegar duas mudas de roupa, inclusive mandei mensagem perguntando se ela precisava que eu fizesse algo na casa, afinal, eu ainda trabalhava para ela. Tive a mensagem ignorada, mas como eu também não fazia questão de me desdobrar por ela, não insisti.
Entrei na casa, peguei minhas roupas e vim embora.
A cada três ou quatro dias eu procurava mandar mensagem perguntando se estava tudo ok ou se ela precisava de algo, mas todas as mensagens passaram a ser ignoradas.
Num dia resolvi buscar mais algumas roupas minhas, pois estava sem, e, pasmem! Casa trancada com uma chave que eu não tinha.
Fiquei duas semanas sem minhas roupas, sem meu material escolar e sem meu pagamento da segunda semana.
Mandei três mensagens dizendo que precisava das minhas coisas e ela respondeu só a última, dizendo que quando chegasse Em Dublin me contataria.
Assim o fez.
Combinamos o melhor dia para eu ir lá. Se não me engano, dois dias após a chegada dela em Dublin.
Fui à casa dela decidida a dizer que não ficaria mais no emprego e, para minha surpresa, quando comecei a falar, cuidadosamente e somente alegando que precisa me dedicar mais aos estudos, ela começou a gritar comigo dizendo que ela era quem não queria mais que eu trabalhasse lá, que eu estava demitida, começou a me xingar, me empurrar e a jogar minhas coisas, que ela tinha juntado sei lá quando (sim, ela mexeu em todas as minhas coisas!), na rua...
Juntei minhas coisas, liguei para a GARDA a fim de denunciá-la, mas infelizmente ficamos esperando uma eternidade sem que nenhum carro aparecesse. Ah! plural porque o Matheus estava comigo. Eu estava achando o comportamento da mulher muito estranho, e como ela era enfermeira, fiquei com medo de ela tentar fazer algo pior. Sim! Quem me conhece sabe: eu sempre dramatizo as situações.
Fomos a uma estação da GARDA para eu tentar registrar e só faltou o policial rir da minha cara. Primeiro porque eu não era daqui, segundo porque eu não tinha contrato, terceiro porque, segundo ele, ela SÓ tinha me empurrado.
Como vocês podem ver, péssima experiência.
O que fica disso tudo?
O aprendizado de nunca mais pegar emprego nenhum sem um contrato com todas as obrigações de cada uma das partes, assim como datas (de entrada, de pagamento...) e respectivas assinaturas.
Além disso, fica a infeliz certeza de que fazemos o mesmo no Brasil com os nossos conterrâneos. Enquanto esticamos um tapete vermelho e abrimos as pernas para quem vem de fora! :(
Um desejo?
O de que repensemos diariamente a nossa atitude com o próximo.
Por que sempre tentamos nos dar bem?
Por que valorizamos o que vem de fora em detrimento do que vem de dentro? E esta última indagação, no sentido mais amplo que se possa interpretar.